terça-feira, 3 de abril de 2012

Intertexto criado a partir de Intervalo Doloroso de Bernardo Soares

Tudo me aborrece, mesmo o que não me aborrece. A minha alegria é mais entediante do que a minha dor.

Os meus afazeres são um subterfúgio estúpido, como perseguir a própria cauda.

São tão inertes, tão pobrezinhos, tão falhos de propósito e sentido.

Por mais que por eles me embrenhe, por mais objectivos que conquiste, todos os caminhos que percorro vão dar a clareiras de futilidade.

Mesmo eu, o que dorme tanto, tenho intervalos em que o sono me foge. Então as noites parecem-me intermináveis. Esvai-se a névoa de que me cerco, a apatia com que me defendo. E todas as rotinas previsíveis estrangulam a carne da minha alma. Todas as durezas diárias me magoam por conhecê-las de antemão. Todo o peso conjunto de dias que se repetem me pesa por a alma dentro.

A minha vida é como se me embalassem com ela.